sábado, março 06, 2010

SUPREMACIA ETNICA!!!

Ainda bem que há gente que pensa com muita cientificidade e banaliza as banalidades!!! Assim se faz a diferença. Os esclarecimentos que Fernando Pacheco prestou sobre a "Supremacia dos Kimbundu" no executivo angolano, materia publicada pelo Semanário angolense, são dignos de umas aulas nas melhores universidades do ocidente. Haja massa cinzenta!!!

Fernando Pacheco fez-me lembrar os tempos da fau. Estava prestes a terminar o curso e precisava arranjar um tema e elaborar o pré-projecto da minha tese. Armado que conhecia Angola, a diversidade do seu povo... e que tinha aprendido muito bem a lição sobre tribo, etnia, grupo étnico, zonas de predominância etnico-tribal... apresentei o meu tema.

Pouco depois, em aula aberta, apresentei o meu pré-projecto. Com a ajuda das tecnologias projetei o mapa de Angola com as imaginários regiões ocupadas pelos supostos grupos étnicos ou tribos.

Terminados os meus 15 minutos, a orientadora simpatica perguntou: quais são os critérios de identificação étnica em Angola? São eles obejctivos ou subjectivos? Dependem dos sujeitos concretos ou é uma construção esteriotipada? Não existem casamentos livres em Angola? A mobilidade das pessoas é proibida? As perguntas foram-se multiplicando e com elas as minhas inseguranças e incertezas. Mas o exercício serviu para aprender algumas coisas que vislumbrei na reflexão de Fernando Pacheco e subscrevo plenamente.

Devo confessar que quando li a matéria sobre "56% do Poder Executivo é Kimbundu" na edição 356 do Semanário Angolense, fiquei muito triste por duas razões:
1ª a leviandade com que o assunto é tratado;
2ª pouco ou nenhum cuidado sobre a operacionalização dos conceitos chaves

Entrtanto, na edição 357, a reflexão de Fernando Pacheco devolveu-me a tranquilidade de espírito que precisava. Nas lidas académicas é mais recomendável falar-se em grupos etno-linguísticos e não mais em tribos ou etnias, termos usados e abusados por uma antropologia, etnologia e etnolinguística de matiz colonialista/racista.

Assim, será mais defensável academicamente o seguinte axioma: os grupos ou comunidades etno - linguísticos estavam tendencialmente distribuidos nas seguintes regiões de Angola (faz-se fé num passado remoto em que era assim, pressuposto normativo). Usa-se o verbo estar no passado porque aceita-se o desconhecimento documentado do movimento migratório dos angolanos em Angola; dos casamentos efectuados entre as várias pessoas de grupos diferentes; e, sobretudo, do actual povoamento de Angola.

Por exemplo, quem vive em Benguela sabe que existem bairros com uma predominância de pessoas que falam português, umbundu, kikongo e crioulo de cabo verde. Será justo afirmar, gratuitamente, que a população de Benguela fala umbundu ou Benguela é uma região umbundu? Ou predominantemente umbundu? Qual é a sustentabilidade empirica de uma afirmação como essa? Esse fenómeno é visível em outras cidades de Angola.

A pertença a um grupo ou comunidade etno-linguísta está intimamente ligada a um sentimento interior. Assim, a identificação de alguém com este ou aquele grupo passa sempre pela partilha de alguns traços característicos desse grupo ou comunidade. Ao limite, estamos a defender que cabe aos individuos concretos identificarem-se ou não com os grupos ou comunidades etno-linguísticas. Caberá aos cientistas sociais a elaboração de um estudo de opinião ou de outra índole para ajudar a avaliar a forma como cada um de nós define a sua identidade nacional ou regional ou etno-linguística ou religiosa...

Há massa cinzenta para avançar. Dinheiro não deverá ser o problema. Basta haver interesse em financiar aqueles que querem trabalhar. Haja mecenas para os grandes e pequenos projectos de investigação social a aguardar por dinheiro nos computadores pessoais de jovens académicos.

Parabéns Semanário Angolense pela iniciativa de lançar a discussão. Parabéns Fernando Pacheco pelos brilhantes esclarecimentos!!!

Katwalisile!

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