quinta-feira, novembro 17, 2005

TRINTA ANOS DE IGREJA EM TRINTA ANOS DE ANGOLA

Misturado aos trinta anos de Angola está a presença da Igreja nos momentos bons e maus por que passam os angolanos. A ânsia pela independência tem o olhar e a mão de pessoas singulares e colectivas da Igreja Católica. Prisões, maus tratos e deportações marcam a história da Igreja antes da independência. Depois desta, e na estrada dos trinta anos de independência, a história está feita de prisões, mortes, destruições, desapropriações, privações, lágrimas, esperanças e de pronunciamentos diante de situações boas e más da vida dos angolanos.
Os pronunciamentos dos Bispos nestes trinta anos de independência são feitos normalmente através de cartas, de mensagens e de notas pastorais nem sempre vistos com bons olhos. Houve quem visse neles uma intromissão, outros quiseram que fossem uma caixa de ressonância dos ressentimentos que nutriam contra o regime vigente no país, outros ainda esperavam que eles manifestassem o pensar de uma sucursal do partido único. No entanto os Bispos fazem sempre questão de lembrar que essa não é missão nem papel da Igreja.
Primeiros dez anos
Os primeiros anos de país são de grande expectativa e de apreensão crescente por parte dos angolanos. A guerra continua, para espanto de todos. O sossego esperado não aparece. A morte e a destruição reinam em Angola e não poupam nada nem ninguém. Nem mesmo a Igreja e os seus missionários.
Os Bispos apreensivos chamam a atenção de governantes e de homens de boa vontade para a necessidade da reconciliação entre todos. “Os angolanos anseiam pela paz a que têm direito, porque não há outra alternativa: ou o extermínio da população, ou a reconciliação da pátria dilacerada” - lembram os Bispos que acrescentam: “a quantos presidem aos destinos deste martirizado povo, ou que de qualquer outro modo interferem na questão da paz da nossa terra, pedimos que façam o melhor que podem para que acabe a guerra e venha a paz e a reconciliação de toda a família angolana”.
Desta fase da história faz parte a primeira reacção governamental, pública, a um pronunciamento da Igreja.
Segunda década
Esta começa com um grito que ao mesmo tempo é uma palavra de ordem e um encorajamento por parte dos Bispos: “Firmes na Esperança”! Comemorando dez anos de independência o retrato do país está bem desenhado na carta pastoral de Fevereiro de 1986: “Nós angolanos, celebramos os dez anos de independência, infelizmente dez anos de armas nas mãos. Como se tanto não bastasse, o espectro da guerra alarga-se cada vez mais, guerra fratricida que vai desgastando o país. Até forças estrangeiras fazem da nossa terra campo de batalha. Somos dizimados física e moralmente. A fina flor da nossa juventude vai tombando na frente dos combates. E muitas vitórias anunciadas são vitórias de morte e destruição.
Nós, porém, repetimos: «a Paz é possível» ”.
A paz na visão dos Bispos, já nessa fase, não só é possível, como é uma exigência. Daí que: “em nome das crianças, em nome dos velhos, em nome dos mutilados, em nome da juventude, cujo futuro até agora foi gravemente hipotecado, em nome de todos os que sofrem os horrores da nossa guerra, pedimos a quantos podem congraçar as partes desavindas – e neste caso poder é dever – que dêem os passos necessários, indispensáveis para o sol auspicioso da paz brilhar na nossa terra”.
Esta é também a fase das primeiras negociações entre o MPLA e a UNITA. Gbadolite, primeiro, e, Bicesse, depois. É a seguir a cimeira de Gbadolite, no ex-Zaíre, e o por ocasião dos catorze anos de Angola que o pronunciamento dos Bispos conhece a segunda reacção oficial, pública, da parte do governo.
Os acordos de paz de Bicesse, bem como as primeiras eleições em Angola merecem vivos aplausos por parte do Episcopado católico: “Felizes os Obreiros da Paz”! Lembra Ele que “… todas as forças são poucas para levantar Angola, a começar pelas vias de comunicação, verdadeiras artérias da sua vida socio-económica. Praza a Deus que lhe não faltem ajudas isentas e bastantes. Quanto a nós Angolanos, todos não somos de mais para tão urgente e patriótica missão. A pátria conta com todos nós”.
Cinco anos de desespero
A segunda metade da década dois de Angola é das mais conturbadas da história. O conflito pós eleitoral é o mais violento de sempre. As esperanças e a boa vontade das pessoas são ignoradas. A apreensão cresce e “A Igreja não pode conformar-se com este estado de frustração e o sofrimento em que o povo se vê novamente imerso. Por isso aqui vimos falar em nome dele, gritando a todos os políticos e responsáveis pelo processo eleitoral de Angola: «Salvai-nos, que perecemos». Trinta dias depois os bispos perguntam: “Uma nova guerra como iria acabar? Com negociações? Com diálogo? Com algum mediador? Então escutem-nos. E com urgência. Aquilo que um dia iriam fazer para a guerra acabar, façam-no já agora para ela não começar”.
A pergunta não é respondida. O apelo não é levado em conta. A situação deteriora-se rapidamente. A fome, a dor, a miséria e a morte graçam pelo país. A ajuda humanitária é muitas vezes condicionada e usada como forma de pressão. As armas falam alto por toda Angola. Contudo a CEAST grita: “Em nome do povo e em nome de Deus, pedimos de todo o coração ao Governo e a UNITA que regressem imediatamente à mesa das conversações, e não venham de lá sem um cessar-fogo assinado que acabe com o inferno desta guerra injustamente imposta ao povo angolano”.
Terceira década
Os acordos de Lusaka marcam a terceira década de vida de Angola. Tal como por ocasião dos de Bicesse, esses acordos foram saudados pelos bispos com alegria e satisfação. Eles lembraram aos políticos e não só, que “o amor à Pátria é uma força poderosa que a torna una e coesa. Mas como pode haver amor à Pátria se não houver amor aos compatriotas? Sem este, a Pátria estaria exposta à sua própria ruína”.
A paz e a tranquilidade de Lusaka duram pouco tempo. A guerra volta ao país. Volta também a destruição. Os Bispos apreensivos lançam um veemente apelo aos homens da guerra e fazem saber que “as motivações da guerra em Angola têm sido qualquer coisa menos o bem dos angolanos”. E acrescentam: “ É impossível amar o povo e fazê-lo sofrer. E quem o não ama não é digno de ser seu governante”.
Os acordos do Luena fecham os anos de guerra em Angola. A preparação para as eleições e os três anos sem guerra devolvem aos poucos a esperança de dias melhores aos Angolanos. Desenvolvimento e progresso é desejo de todos. Vale no entanto recordar a chamada de atenção dos Bispos: “Se queremos construir deveras o futuro da Nação, temos a certeza de que isso jamais será possível sem consciências rectas, sem homens honestos e responsáveis na sua profissão, no seu emprego, no seu cargo, nos seus negócios, na sua vida, já pública já privada. Sem homens desta têmpera, o País não se pode erguer à dignidade que merece”.

Ao longo destes trinta anos, dois pronunciamentos têm resposta imediata da parte do governo de Angola. O primeiro é feito no Lubango. Neste os Bispos reagem ao facto de o Governo e o Partido terem declarado ser o marxismo-leninismo a linha ideológica oficial de Angola. A crítica à religião intensifica-se. A tendência à criar divisão dentro da Igreja e à separar esta da Igreja Universal acentua-se. Na carta pastoral os Bispos aproveitam para elucidar os cristãos e o povo sobre a fraqueza do sistema ideológico escolhido.
A reacção é forte. O editorial do Jornal de Angola de 26.01.1978, traz como título, e a vermelho, “OS BISPOS E A CONSPIRAÇÃO”. Seguem-se uma série de dificuldades para a Igreja. Missionários são impedidos de entrar. A Emissora Católica de Angola é confiscada. Aumenta a pressão sobre trabalhadores e funcionários católicos.
Uma outra reacção pública do governo tem a ver com a mensagem de 11.11. 1989. “Os últimos acontecimentos da história recente dizem-nos que os povos hoje caminham para a Paz, o progresso, a liberdade, a democracia. Um sistema político deste género dignificará a nação angolana, o seu povo e os seus chefes.
Não queiramos para Angola caminho diferente”.
A direcção nacional para os assuntos religiosos repudia a mensagem e taxa-a de panfleto clerical. “O documento subscrito pelos “Bispos Católicos de Angola” procura torná-los intérpretes “do povo sofredor” de Angola.
Mandatos desta natureza estão regulamentados por instrumentos jurídicos estabelecidos pelos direitos e deveres dos cidadãos, consubstanciados na lei constitucional a que todo o povo deve obediência incluindo “os Bispos Católicos de Angola”.”
Na mesma edição do Jornal de Angola, o jornal comenta a mensagem sob o título: «A DEUS O QUE É DE DEUS». Eis, um extracto do comentário: “Os bispos católicos e os fiéis da sua igreja têm outros meios e lugares próprios para buscarem a paz que dizem desejar, sem terem a pretensão de dar conselhos a quem deles não necessita, ou de se substituírem ao estado em que se integram. “A César o que é de César e a Deus o que é de Deus”.”

Samy de Jesus, Jornalista da Rádio Benguela

2 comentários:

ELCAlmeida disse...

Caro Patacolo,
Importante a inserção deste comentário de Samy de Jesus.
Importante e interessantes.
Kandando
Eugénio Costa Almeida

vanderlen disse...

ola meu irmao graca e paz do nosso senhor jesus crito. tenho interece em saber de como comecou o processo de invangelizacao em angola. n me refiro a igreja catolica em si mas todo processo ate aos dias de hoje tenho conhecimento de que foram os primordios os holandeses e portugueses. obrigado pela tua paciencia. meu imail: vanderlen_candeia@hotmail.com